Literacia financeira pós-COVID 19
“Porque a diversidade é condição de humanidade, a política emerge no espaço entre as pessoas…”
Hanna Arendt
Felicito a Fundação Dr. António Cupertino de Miranda pelo seu pioneirismo na abordagem e tratamento da educação financeira nas escolas, no museu e agora também a distância. Ao longo de dez anos o seu projecto “No poupar está o ganho” tem conseguido formar professores, produzir e disponibilizar recursos pedagógicos, acompanhar e monitorizar o trabalho nas escolas, colaborar na avaliação da literacia financeira dos alunos. Um belo exemplo de introdução e implementação de uma inovação educativa que, como cidadã, agradeço à Fundação e, em especial, ao seu principal motor Maria Amélia Cupertino de Miranda.
Creio, no entanto, que os efeitos da pandemia da COVID 19 não se limitarão à necessidade de recorrer cada vez mais ao digital e à educação a distancia, Eu diria, talvez provocatoriamente, que é a própria concepção de literacia financeira que merece ser revista: por um lado para contemplar não só o bem estar individual mas também o bem estar social, a revalorização dos serviços públicos (o Sistema Nacional de Saúde, a escola pública…) e o papel dos impostos para os financiar *. Por outro lado, para, integrada na Educação para a Cidadania , incluir temas polémicos, “questões socialmente vivas”, que permitam aos jovens conhecer e reflectir sobre os problemas actuais do mundo e a diversidade de propostas de solução.
Um tema como a “moeda virtual” (moeda digital, criptomoeda, bitcoin…) é uma “questão viva”, isto é, uma verdadeira questão, um tema que se discute na comunicação social e sobre o qual se vai construindo conhecimento que atravessa diversos saberes e disciplinas e aponta para o futuro.
Ou o tema do “rendimento básico universal” que é também uma questão viva: aparece como uma resposta possível ao desaparecimento ou à redução de postos de trabalho pela revolução tecnológica em curso e agora acelerada. Levanta questões éticas e de psicologia individual e de massas. Uns temem-no, outros defendem-no entusiasticamente. É um tema polémico, uma “questão viva”!
O próprio tema dos Impostos, já atrás referido como fundamental numa Educação para a Cidadania, é também um tema polémico. A sua função remete-nos não só para o financiamento de serviços como a saúde e a Educação, como também para o seu papel na redistribuição da riqueza, no combate às desigualdades e no contributo para a coesão social, para a necessidade de contribuirmos todos para o bem comum. É um tema bem polémico, é certo, mas por isso mesmo bem interessante, sobretudo a partir da adolescência, no Secundário, sendo conveniente ouvir várias partes, vários pontos de vista e conhecer a sua evolução ao longo da História e a diversidade de soluções encontradas em diferentes países e em diferentes momentos.
São temas transversais para os quais não há respostas únicas, nem fixas, nem simples. Que se prestam bem para servirem de motor à procura de informação, seu aprofundamento, recolha de diferentes perspectivas, debate, construção duma opinião própria, sua defesa… ou seja para o desenvolvimento de competências de empatia, colaboração, comunicação, persuasão e reflexão próprias de cidadãos duma sociedade democrática.
*Ver, por exemplo, o recentíssimo “Ensaio de Finanças Públicas”, publicado por Eduardo Paz Ferreira na Almedina, em setembro 2020.